Política

Covas insiste em ‘radicalismo’ e Boulos ironiza ‘discurso autoritário’

Candidatos do PSDB e do PSOL que disputam 2º turno em São Paulo participaram de debate na CNN

Os candidatos a prefeito de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL) e Bruno Covas (PSDB). Foto: Reprodução
Apoie Siga-nos no

Os candidatos a prefeito de São Paulo que estão no 2º turno, Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL), trocaram críticas no debate realizado pela emissora CNN Brasil nesta segunda-feira 16, primeiro enfrentamento na nova fase da campanha. Enquanto Covas tentou colar em Boulos a pecha de radical e inexperiente, o candidato do PSOL rebateu o que chamou de “discurso autoritário” e afirmou que o tucano “entrou num vale-tudo para ganhar a eleição”.

“O radicalismo ideológico sabe criticar, mas não sabe salvar vidas”, disse Covas, já no primeiro tema do debate, sobre a pandemia do novo coronavírus.

Em momentos posteriores, insistiu em frases como “veja a diferença que faz não ter experiência” e chegou a designar Boulos como “chefe de um movimento, acostumado a mandar”.

Até entendo a dificuldade do Guilherme Boulos: como chefe de um movimento, está acostumado a mandar. Mas ser prefeito é mais do que isso. É ser um servidor público, ouvir as pessoas, disse Covas

Em resposta, Boulos disse lamentar que Covas faça “eco a um discurso autoritário”.

“Para ter o voto de pessoas mais simpáticas ao Jair Bolsonaro, você tenta ser aquilo que não foi até aqui”, disse o candidato do PSOL. “Ontem, fiquei assustado quando vi o seu discurso após a apuração. Discurso cheio de raiva. Não sei. Talvez porque você achou que a eleição estava ganha, ficou preocupado com o crescimento que nós tivemos, e agiu dessa forma.”

Bruno, isso te diminui. Você não precisa disso, para fazer essa disputa no 2º turno, ficar atacando movimento social. Você pode ser muito melhor do que isso, disse Boulos

De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no 1º turno, Covas acumulou 32,85% dos votos, contra 20,24% de Boulos. Ambos ultrapassaram 1 milhão de votos.

Veja os principais pontos da discussão:

Crise da Covid-19

Boulos criticou a gestão Covas por, segundo ele, não ter feito a “lição de casa”, com testagem em massa, monitoramento epidemiológico e uso de equipamentos públicos.

O candidato do PSOL propôs usar uma rede com 8 mil agentes comunitários de saúde para diagnosticar a população e utilizar instituições públicas, como escolas, para garantir isolamento a grupos de risco que não têm moradia.

Criticou a instauração de quatro hospitais de campanha, sendo apenas um na periferia, e disse que o dinheiro gasto nesses empreendimentos deveria ter sido revertidos em equipamentos para hospitais públicos que já existem, mas estão fechados ou desfalcados, como o Hospital Sorocabana, no bairro da Lapa, o Hospital da Brasilândia e o Hospital Menino Jesus, na Bela Vista.

“A forma como a Prefeitura lidou com a pandemia, em termos de saúde pública, foi muito ruim. Tem bairros em que faltam respiradores, médicos, e não houve contratação emergencial. Pinta-se um mundo maravilhoso na sua propaganda, que quem vive na rua não vê”, acusou Boulos.

Covas queixou-se da postura de Boulos, que o chamou de “engenheiro de obra pronta”, e prestou contas sobre as ações da sua gestão, como o levantamento de dois hospitais de campanha em 15 dias.

“Não tivemos cenas de médicos escolhendo quem intubar ou não”, disse o tucano, reiterando que as medidas foram realizadas com acompanhamento de técnicos da vigilância sanitária. “Ninguém que buscou tratamento ficou deixado de fora.”

Covas disse que Boulos agiu com desrespeito aos profissionais de saúde ao criticar a gestão da pandemia, e acrescentou que “não se termina uma obra em 15 dias”. A posição do tucano foi rebatida por Boulos, que lembrou ser filho de médicos.

Padrinhos políticos, entre Doria e Lula

Em pergunta da emissora sobre padrinhos políticos, Covas rejeitou o assunto como relevante, mesmo sendo apoiado pelo governador de São Paulo, João Doria (PSDB). “Aqui não se trata de quem tem o melhor ou o pior apoio político, atacando o ex-presidente Lula ou o ex-prefeito Haddad”, disse Covas.

Covas aproveitou o tempo, então, para enumerar seus feitos em outras áreas, e afirmou ter zerado as filas para a pré-escola e para as vagas em creches. Também propôs manter um benefício para mães em situação com alta vulnerabilidade, estimado em 200 reais.

Já Boulos optou por se manter no tema e lembrou da aliança “Bolsodoria”, firmada por João Doria durante sua campanha para governador em 2018, quando apoiou Bolsonaro à Presidência. Sua estratégia foi relacionar frontalmente Covas a Doria, lembrando que o governador abandonou a Prefeitura de São Paulo com apenas dois anos de gestão.

“Eu entendo que a questão do Doria seja tão incômoda, ao ponto de você buscar outro tema. É incômoda, porque o Brasil e São Paulo mudaram de 2018 para cá. Em 2018, muita gente votou com ódio, usando cano de revólver para apertar os botões da urna. Foi quando surgiu o Bolsodoria”, disse Boulos.

Aumento de impostos

Boulos se comprometeu a não aumentar a carga tributária municipal, “ainda mais em período de crise”. Ele sugere a criação de um “plano de enfrentamento e de recuperação econômica”, baseada em um benefício chamado Renda Solidária, com promessa de atender até 1 milhão de famílias com valores entre 200 e 400 reais.

“Alguém que receber, vai gastar na padaria, na farmácia, no açougue do bairro”, disse.

Também prometeu criar 50 mil vagas por frentes de trabalho, em todas as subprefeituras do município, para atuar em funções de zeladoria, como a limpeza de córregos e bueiros e a manutenção de praças e parques. Disse ainda que cobrará cerca de 130 bilhões de reais “que grandes devedores devem, por sonegação e fraudes discais”, para incrementar um caixa de cerca de 19 bilhões de reais que a cidade já tem.

Covas alegou que chegou à Prefeitura com um rombo de 7 bilhões de reais, de 2017, e enumerou medidas como o corte de 30% nos cargos de confiança, a implementação de um programa de desestatização e a redução de empresas, fundações e autarquias municipais.

Também afirmou que manterá um valor de 4,5 bilhões de reais em investimentos municipais, sem aumento de IPTU, e que focará na economia criativa ligada a eventos culturais e turísticos.

Iluminação pública

Em um bloco que permitiu a Covas fazer uma pergunta sobre parcerias com empresas privadas (PPPs) para o serviço de iluminação pública, Boulos disse que a estratégia contribui para a elitização do acesso, com aumento de tarifas.

“As experiências de PPPs da habitação, quando entra a iniciativa privada, ela quer lucro. Para atender os que mais precisam, a conta não fecha: a prestação varia de 800 a 900 reais, e a pessoa com salário mínimo não consegue entrar”, disse o candidato do PSOL.

Já Covas afirmou que as parcerias com empresas privadas têm permitido que a prefeitura possa focar “no que é sua atividade essencial”. Também afirmou que o serviço de iluminação colabora para a diminuição da criminalidade.

“O radicalismo ideológico sabe criticar, mas não sabe como reduzir crimes na cidade”, acusou o tucano.

Em resposta, Boulos disse que o investimento na iluminação “é fundamental”, mas em questão de segurança pública, a cidade conta com um efetivo de guardas menor que o do Rio de Janeiro, e a gestão atual coloca os agentes “para arrancar cobertor de morador de rua e correr atrás de ambulante”.

População em situação de rua e Cracolândia

Em pergunta de Boulos, Covas afirmou que a sua gestão teve como “um dos grandes desafios” a redução da população de rua, mas admitiu aumento de pessoas nessa condição entre 2016 e 2019, de 16 mil para 24 mil.

O tucano afirmou que articulou propostas de hotéis para realizar atendimentos humanizados e disse que ofereceu 4 mil vagas em abrigos, com disponibilidade de 24 horas.

“O morador de rua chegava e tinha que sair do abrigo. Agora, com vagas 24 horas, ele tem tranquilidade”, disse Covas. “Não tivemos superlotação dos abrigos da cidade de São Paulo. Transformamos alguns clubes municipais fechados em abrigos. Não adianta chegar aqui, chutar um número mágico, sem saber a realidade.”

Sobre a Cracolândia, Covas disse que ofereceu tratamento individualizado, com acompanhamento médico, mas rechaçou programas que ofereçam bolsas como forma de “tratamento”.

Boulos argumentou que o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) recomendou a abertura de oito mil vagas em hotéis para pessoas em situação de rua, mas a medida não foi cumprida – a orientação ocorreu em maio deste ano.

O candidato do PSOL criticou Covas por não ter aberto procedimentos de contratação emergencial para assegurar essas vagas. Também prometeu substituir os albergues que, segundo ele, “não são espaços humanizados”. Sua proposta é fundar “Casas Solidárias”, com atuação de assistentes sociais e tratamento especializado.

Ele diz se inspirar em modelos internacionais, citando cidades como Lisboa e Vancouver.

“Você e o Doria, quando se elegeram, o Doria prometeu acabar com a Cracolândia. Esse é um uso eleitoreiro para um problema tão complexo”, afirmou.

Coleta do lixo

Covas afirmou que a próxima gestão é o “grande momento” para rediscutir os contratos de concessão do serviço de coleta de lixo, previstos até 2024. Enumerou ações em feiras populares, como centrais de compostagem para resíduos, que ele disse ter herdado da gestão de Fernando Haddad, com ampliação em seu mandato.

Também elogiou a aprovação do novo marco do saneamento básico. Segundo ele, será aberta uma “janela de oportunidades” para novas negociações com companhias.

Já Boulos prometeu um “tratamento inovador” ao tema dos resíduos sólidos, propondo modelos de “ecoparques” que ele diz se inspirar em Barcelona. Também propôs parcerias com cooperativas de catadores, para “universalizar a coleta seletiva”.

“A coleta seletiva não está universalizada no porta a porta”, afirmou Boulos.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Leia também

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo